Muitos servidores públicos têm indagado sobre as vantagens que o cargo exclusivo de Estado, previsto na reforma administrativa, conforme o texto adotado na Comissão Especial, tem em relação aos demais ocupantes de cargo efetivo. O objetivo deste texto é esclarecer o que propõe o substitutivo da PEC 32, da reforma administrativa, sobre o tema.
Por Antônio Augusto de Queiroz (*)
Muitos servidores públicos têm indagado sobre as vantagens que o cargo exclusivo de Estado, previsto na reforma administrativa, conforme o texto adotado na Comissão Especial, tem em relação aos demais ocupantes de cargo efetivo. O objetivo deste texto é esclarecer o que propõe o substitutivo da PEC 32, da reforma administrativa, sobre o tema.
Vamos iniciar esclarecendo o que é cargo efetivo e quais são as garantias decorrente dele, de acordo com o texto atual da Constituição, para, na sequência, tratar das mudanças propostas no substitutivo à PEC 32 sobre o assunto.
O primeiro aspecto a esclarecer é que todos os servidores públicos federais que ingressaram ou vierem a ingressar na Administração Direta, nas Fundações e Autarquias por concurso público com base nas regras atuais, e que foram ou vierem a ser aprovados no estágio probatório, são detentores de cargo efetivo. E os detentores de cargos efeito, estejam ou não no exercício de atividade exclusiva de Estado, gozam da estabilidade no cargo e só podem ser demitidos nas hipóteses previstas na Constituição Federal.
De acordo com a Constituição Federal (CF), o servidor público efetivo só pode ser demitido em quatro hipóteses: 1) em virtude de decisão judicial transitada em julgado, conforme § 1º, inciso I, do art. 41 da CF; 2) mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa, conforme § 1º, inciso II, do art. 41 da CF; 3) mediante procedimento de avalição periódica em que lhe seja assegurada ampla, conforme § 1º, inciso III, do art. 41 da CF, e 4) por excesso de gasto, após a redução de pelo menos 20% dos cargos e funções de confiança e a exoneração dos servidores não-estáveis, conforme § 3º, inciso II, do art. 169 da CF.
Registre-se que a possibilidade de dispensa por insuficiência de desempenho, referida no item 3 do parágrafo acima, ainda não foi implementada, porque depende da regulamentação em Lei Complementar do art. 247 da Constituição, cuja finalidade é exatamente estabelecer critérios e garantias especiais para a perda de cargo pelo servidor púbico estável que, em decorrências das atribuições de seu cargo efetivo, desenvolva atividades exclusivas de Estado.
Assim, de acordo com as regras atuais da Constituição Federal, todos os servidores estáveis, mesmo que venha a ser regulamentado o art. 247 da Constituição, continuariam a ser ocupantes de cargo efetivo, estando ou não no exercício de atividades exclusiva de Estado. A diferença, na hipótese de regulamentação da dispensa por insuficiência de desempenho, é que os servidores ocupantes de cargo efetivo estável que desenvolvessem atividades exclusivas de estado teriam proteção adicional em relação aos demais. Além disso, no caso da demissão por excesso de despesas, já regulamentada pela Lei nº 9.801, de 1999, ela somente é admitida quando já houverem sido demitidos pelo menos 30% dos servidores dos demais cargos do órgão ou da unidade administrativa objeto da redução de pessoal.
O substitutivo à PEC 32, da reforma administrativa, entretanto, propôs alterações nas regras de estabilidade dos servidores efetivos, atuais e futuros, acrescentando novas condições para justificar a dispensa sem indenização, como a decisão judicial proferida por órgão judicial colegiado – além das previstas na atual Constituição (trânsito em julgado, processo administrativo, avaliação de desempenho e excesso de gasto com pessoal) – bem como trouxe a previsão de dispensa com indenização (de um mês de remuneração por ano de serviço), no caso de extinção do cargo por lei específica em razão do reconhecimento de que se tornou desnecessário ou obsoleto. Os cargos ocupados por servidores estáveis admitidos até a data de promulgação desta emenda, só poderão ser extintos após a vacância.
O mesmo substitutivo propõe nova redação ao art. 247 da Constituição, para tratar de forma diferenciada os servidores públicos investidos em cargos exclusivos de Estado, assim compreendidos os que exerçam diretamente atividades finalísticas afetas à segurança, à manutenção da ordem tributária e financeira, à regulação, à fiscalização, à gestão governamental, à elaboração orçamentária, ao controle, à inteligência de Estado, ao serviço exterior brasileiro, à advocacia pública, à defensoria pública e à atuação institucional do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, incluídas as exercidas pelos oficias de justiça, e do Ministério Público. Exclui do tratamento diferenciado os servidores cujas atribuições sejam complementares, acessórias, de suporte ou de apoio às atividades desses poderes e órgãos.
Note-se que em relação aos Poderes Legislativo e Judiciário e ao Ministério Público, o texto garante tratamento diferenciado à “toda” atuação institucional desses poderes e órgãos, logo deixando implícito que todos os servidores desses dois poderes e do Ministério Público serão considerados ocupantes de cargo exclusivo de Estado.
Mas, afinal, qual será o alcance do “tratamento diferenciado” a ser dado aos servidores ocupantes de cargos exclusivos de Estado? De acordo com § 7º do art. 169 da Constituição, com a redação proposta pelo substitutivo à PEC 32, o tratamento diferenciado a ser deferido aos ocupantes de cargo exclusivo do Estado ficará limitado aos casos em que haja redução de jornada com redução de salário, além da proibição de terceirização de suas atividades. Mas não impede a contratação temporária, limitada a dois anos, nem livra os ocupantes de cargo exclusivo de Estado da dispensa decorrente: a) de processo administrativo; b) de decisão transitado ou julgado ou proferida por órgão judicial colegiado; c) de dispensa por insuficiência de desempenho; e d) da dispensa por excesso de gastos, nos termos da lei já em vigor.
Como se pode depreender da leitura deste texto, as vantagens de ocupar cargo exclusivo de Estado são modestas, porém haverá menos riscos de terceirização da atividade, e dispensa por excesso de gasto ocorrerá apenas quando pelo menos 30% dos demais servidores houverem sido demitidos. A lei deverá definir como se dará o tratamento diferenciado quando, em razão de excesso de despesas com pessoal, houver redução de jornada com redução de salário, que será aplicada sem esse tratamento diferenciado aos demais servidores efetivos. Por fim, os demais servidores estarão sujeitos à redução de jornada e de salário e às quatro hipóteses de dispensa, bem como à terceirização e a contratação temporária, por até dez anos, nas áreas de sua atuação, o que impediria, na prática, a realização de concurso público.
(*) Jornalista, analista e consultor político, além de sócio das empresas “Queiroz Assessoria em Relações Instituições e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”.