Foi aprovado nesta semana o Projeto de Lei nº1.293 que dispõe sobre o sobre os programas de autocontrole dos agentes privados regulados pela defesa agropecuária e sobre a organização e os procedimentos aplicados pela defesa agropecuária aos agentes das cadeias produtivas do setor agropecuário; institui o Programa de Incentivo à Conformidade em Defesa Agropecuária, a Comissão Especial de Recursos de Defesa Agropecuária e o Programa de Vigilância em Defesa Agropecuária para Fronteiras Internacionais (Vigifronteiras).
Desde a apresentação do texto inicial, proposto pelo Executivo, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical) vem se posicionando em posição contrária ao PL, por considerá-lo perigoso para a saúde humana, o meio ambiente e o bem-estar animal.
Conforme a tramitação do Projeto de Lei avançou, o Anffa Sindical uniu-se a importantes entidades e organizações civis na tentativa de alertar a sociedade quanto aos riscos que a aprovação do PL significava, entre elas, a Animal Equality, um de seus mais expressivos apoiadores.
A referida instituição, que se apresenta como “uma das organizações defensoras de animais de produção mais eficientes no mundo” produziu e compartilhou documentos que atestam a situação precária e atual de manejo dos animais de produção, e que tende a piorar com a aprovação do PL 1.293/2021, uma vez que delega às próprias indústrias o poder de se autofiscalizar, entre outras modificações relevantes.
Em relatório produzido em junho deste ano, a Animal Equality, constatou a condição de abate clandestino em diversas unidades frigoríficas do País. De acordo com o relatório final da investigação: “Os matadouros brasileiros precisam de mais fiscais e de uma fiscalização mais rigorosa e efetiva, não o oposto.”
Ocorre que, com a aprovação do Projeto de Lei na última terça-feira (20), consumidores, ativistas e a própria mídia debruçaram-se sobre o assunto e suas possíveis implicações. Exemplo disso, foi o debate ocorrido no programa jornalístico “Em Pauta”, do canal Globo News no qual o jornalista André Trigueiro falou a respeito da pauta e mais especificamente, da questão do bem-estar animal, ao que informou à audiência do veículo que os auditores fiscais federais agropecuários não realizam ações de fiscalização direcionadas ao bem-estar dos animais de produção.
Diante disso, o Anffa Sindical esclarece que todas as práticas compreendidas entre os métodos humanitários de manejo pré-abate e abate dos animais de açougue e de pescado e os requisitos para seu atendimento, a fim de evitar dor e sofrimento desnecessários, a serem aplicados em todos os estabelecimentos regularizados pelos serviços oficiais de inspeção que realizam abates de animais para o consumo humano ou para outros fins comerciais são reguladas pela Portaria Nº 365, de 16 de julho de 2021, que aprova o Regulamento Técnico de Manejo Pré-abate e Abate Humanitário e os métodos de insensibilização autorizados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
O normativo regula ainda os veículos, instalações, e equipamentos destinados ao transporte e contenção de animais; elenca proibições e determina ainda que todo estabelecimento que desenvolva atividade de abate deve designar um responsável pelo bem-estar animal em sua unidade industrial.
Além disso, estabelece que caso os procedimentos estabelecidos na Portaria venham a se tornar desatualizados em relação às recomendações internacionais, deve-se observar o disposto naqueles documentos até que haja a atualização do disposto no normativo brasileiro, isto, a fim de preservar as boas práticas de abate humanizado dos animais manipulados nesses locais.
De maneira complementar também determina que os próprios estabelecimentos possuam programas e parâmetros que visem a proteção e o bem-estar dos animais, os quais também são fiscalizados pelos auditores agropecuários.
Nesse sentido, é a Norma Interna DIPOA/SDA nº 01, de 08 de março de 2017, que orienta o auditor sobre como proceder a fiscalização em relação aos controles disponibilizados pelas indústrias.
Como se pôde considerar, a observância dos princípios de bem-estar animal está contida no escopo de atuação dos auditores fiscais federais agropecuários. A grande lacuna apontada tanto por organizações do setor como pelos próprios auditores agropecuários é a falta de servidores que possam realizar esses controles com a frequência adequada.
Em entrevista a um auditor lotado no Serviço de Inspeção Federal (SIF), a seguinte situação foi apresentada. “Apesar de a NI 01 recomendar que cada Elemento de Inspeção (Bem Estar Animal, Manutenção das Instalações, Controle de Pragas, Controle de Temperaturas, entre outros) contido na norma tenha de ser verificado “in loco”no mínimo uma vez por ano, obedecendo uma frequência quinzenal de fiscalização para cada item, essa mesma frequência faz com que cada elemento seja verificado apenas uma ou duas vezes por ano.” Isso em decorrência da quantidade de itens a fiscalizar, que é inversamente proporcional à quantidade de auditores agropecuários disponíveis.
Além disso, são realizadas verificações documentais desses estabelecimentos a cada três meses, e evidentemente, em caso de o auditor observar descumprimento de um ou mais preceitos definidos pela Norma, é permitido que atue a qualquer tempo, de maneira a sanar a inconformidade constatada.
Assim, percebe-se a justificativa do relatório produzido pela Animal Equality ao opôr-se ao PL do Autocontrole e cobrar um modelo de fiscalização mais efetivo. Ao mesmo tempo, desde julho de 2021, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários tem alertado parlamentares e autoridades governamentais acerca do déficit de cerca de 1.640 servidores no Ministério da Agricultura, um percentual de quase 40%.
Em fevereiro deste ano, a então Ministra da Agricultura Tereza Cristina enviou ofício ao Presidente da República solicitando a realização de concurso público para a carreira. *“O serviço de Defesa Agropecuária alcançou seu limite. Os riscos são consideráveis.”* afirmou a ex-ministra.
Mesmo sem respostas concretas por parte do Executivo, até o final de 2022 os auditores fiscais federais agropecuários têm sido incansáveis na execução de suas atribuições, impedindo a entrada de pragas e doenças no país, certificando o alimento que chega à mesa do brasileiro e dos países importadores, e permanecendo alertas e atuantes para que o sucateamento da carreira não possa perdurar por mais quatro anos.