“Estamos diante de uma grande oportunidade para explorar e agregar valor nos produtos que o Brasil exporta.”
O último painel de discussão do II Sedagro começou de maneira distinta dos demais. O diretor de departamento da Secretaria de Administração do Anffa Sindical pediu a palavra e prestou uma bela homenagem à delegada sindical de São Paulo, Gisele Camargo. “Uma pessoa que se dedica diariamente, de modo incansável em busca de soluções para os anseios dos filiados de seu estado, em prol da coletividade” , disse o diretor.
Outras homenagens foram prestadas ainda, pelo presidente do Anffa Sindical, Janus Pablo, ao próprio diretor de departamento. “Quando penso que não darei conta de alguma demanda, me lembro do Danilo e sua disponibilidade em contribuir” e ao diretor de comunicação, Antonio Andrade. “Sem ele não estaríamos aqui. Colega que possui comprometimento e dedicação muito grandes para com a carreira” , destacou.
Finalizados os agradecimentos, o auditor fiscal federal agropecuário da Superintendência Federal de Agricultura do Estado do Paraná (SFA-PR/MAPA), Elton Massarollo apresentou os convidados do painel de discussão e ponderou sobre a grande questão que circunda o debate sobre proteínas vegetais: a nomenclatura.
“Do ponto da produção animal, as proteínas de origem vegetal não podem se apropriar da nomenclatura. Por outro lado, defensores da inovação argumentam que é preciso mencionar o produto animal como referência, para que o consumidor saiba o que aqueles produtos são. Como se equaciona isso numa regulamentação?” , provocou.
A Professora Titular do Departamento de Ciência dos Alimentos, Universidade Federal de Lavras (UFLA) e docente no Laboratório de Avaliação Nutricional e Funcional de Alimentos (LANFA), Ellen Cristina de Souza foi objetiva e declarou que o termo incomoda a academia pois essa classe de novos produtos tem composição química diferente das proteínas tradicionais. “Nossa grande preocupação diante das proteínas de origem vegetal se deve à comprovação nutricional relativa se comparadas às proteínas de origem animal. Especificamente em relação à presença de aminoácidos essenciais.”
Diante dessa colocação, o Assessor de Políticas Públicas do Good Food Institute (GFI/BR), Alexandre Moura Cabral compartilhou informações de um estudo teórico de acompanhamento nutricional promovido pelo instituto. “Chegamos à conclusão de que o desvio padrão nutricional entre os alimentos plant based é semelhante ao que ocorre nas proteínas animais. Além disso, constatamos que as fontes vegetais de proteína possuem características de saudabilidade e nutrição próprias, que não se encontram na carne convencional por exemplo.”
Cabral informou ainda que o GFI solicitou um estudo mais detalhado à Universidade Federal de São Paulo, no qual esses produtos devem passar por análises laboratoriais, e que há a expectativa de entrega dos resultados dessa pesquisa no segundo semestre deste ano.
Ultrapassados os questionamentos a esse respeito, a Coordenadora de Regulamentação da Qualidade Vegetal e Diretora Substituta do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal do Ministério da Agricultura e Pecuária, Karina Fontes, dividiu com a audiência as ações mais recentes que o departamento vem realizando em referência aos plant based. “Solicitamos aos nossos adidos agrícolas que investigassem como o tema está sendo tratado em outros países do mundo e constatamos que em nenhum lugar há uma denominação específica. Estão todos trabalhando em regulamentação.”
Nesse aspecto, Antonio Marcos Pupin, Diretor de Assuntos Regulatórios e Científicos da Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI), lembrou que as proteínas vegetais fazem parte de um mercado que cresce cerca de dois dígitos ao ano e que a questão de rotulagem permeia não só o Brasil mas o mundo. “Do ponto de vista nutritivo não há diferença entre um e outro tipo de proteína. Se houver necessidade de rotulagem específica, ela será feita, pois se o consumidor não aceitar aquele formato, o fornecedor vai mudar.”
O diretor aproveitou também a oportunidade de fala para exaltar a posição dos órgãos reguladores até o momento que têm se mostrado preocupados e disponíveis a dialogar com a sociedade, em detrimento da tomada de decisões açodadas que prejudicassem um lado e favorecessem outro.
Questionada sobre o que tem regido a entrada e presença desse tipo de produto no mercado durante essa lacuna de regulamento, a coordenadora de regulamentação do MAPA, Karina Fontes informou que atualmente o departamento trabalha com um normativo de transição que estabelece padrões mínimos de qualidade e de informações na rotulagem. Apesar disso, o trabalho de regulamentação acontece em paralelo, e uma consulta pública deve ser aberta em breve.
Ao mesmo tempo, anunciou que o DIPOV tem trabalhado no Regulamento de Inspeção Industrial dos Produtos com Origem Vegetal, um normativo análogo ao RIISPOA o qual é direcionado aos produtos de origem animal, e que o documento deve ser apresentado nos próximos meses.
Perspectivas
Para o futuro, Alexandre Cabral lembrou que fabricantes de chá diziam que o café era uma bebida demoníaca no início do século XX e que a bebida chegou a ser proibida pela igreja. Em relação ao tema de discussão ponderou que “por trás de toda tecnologia, engenharia e ciência há um elemento estrutural que é o aumento crescente da demanda de proteína animal no mundo.” Segundo ele, é necessário aproveitar a disponibilidade de tecnologias que crescem e permitem produzir uma nova categoria de produtos que se pretende semelhante aos produtos de origem animal.
Antônio Pupin lembrou também que no último mês a Food and Drug Administration dos Estados Unidos (FDA) autorizou o uso de termos oriundos da área animal pela indústria vegetal e incentivou: “Estamos diante de uma grande oportunidade para explorar e agregar valor nos produtos que o Brasil exporta.”
A Assessora Técnica da Associação Brasileira da Indústria e Comércio de Ingredientes e Aditivos para Alimentos (ABIAM), compartilhou desse pensamento: “O Brasil é o maior fornecedor mundial de proteína animal e tem potencial para ser um dos grandes fornecedores de proteína vegetal” , mas alertou: “É necessário que haja uma regulamentação compartilhada entre o MAPA e a ANVISA, já que essas proteínas alternativas, oriundas de fontes diversas, precisam ter análise de segurança, de toxicidade e de aditivos” e finalizou elogiando a iniciativa do debate, que em sua visão, é imprescindível para se chegar a uma conclusão.
Como representante do setor regulador, Karina Fontes assegurou que “quando o governo defende a regulamentação ele não defende um ponto de vista. É importante ter em conta que o regulamento não só autoriza o novo como também protege o tradicional.” Em contrapartida, como membro do setor regulado, Antônio Pupin relembrou a importância de um regulamento ponderado, que não iniba o processo de inovação.
Em suas considerações finais, a professora Ellen reiterou seu posicionamento alertando que “é preciso olhar pra frente com conhecimento, não só pelo modismo” e colocou-se à disposição para novos diálogos. “A academia ajuda no que for possível, pois nossa função é ensinar.”
O painel de discussão foi encerrado com uma bela reflexão do auditor agropecuário e mediador Elton Massarollo, que destacou a importância da comunicação para a construção do resultado desejado.
Para isso, traçou um paralelo entre os três paradigmas da formação do conhecimento: O primeiro deles, o SER, defendia que o conhecimento era determinado. No segundo paradigma, o da CONSCIÊNCIA, passou-se a acreditar que cada indivíduo diferente em si era um agente de transformação e o terceiro é o da LINGUAGEM, que diferencia os seres humanos dos demais. “Temos a capacidade de construir a comunicação que precisamos” , finalizou.