Áreas de saúde e educação concentraram o crescimento do número de servidores nas últimas três décadas
Mais da metade dos 12,4 milhões de funcionários públicos brasileiros trabalha em prefeituras, aponta estudo inédito elaborado para a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público. Num ano de eleições municipais, esse pode ser um fator de complicação política para o governo avançar com as reformas econômicas no Congresso.
Muitos parlamentares, principalmente deputados, são candidatos a prefeito. Por mais que compreendam a importância das reformas econômicas e até concordem, deverão pensar duas vezes antes de apoiar medidas duras contra professores, médicos e enfermeiros que atuam em suas bases eleitorais. Foi nas áreas de saúde e educação que se concentrou o crescimento do número de servidores nas últimas três décadas, de acordo com o estudo.
“O ano eleitoral é, sim, uma pressão sobre o governo federal, e nós vamos usá-la”, afirmou o deputado Professor Israel Batista (PV-DF), presidente da Frente. O posicionamento dos parlamentares em relação às reformas será explorado nas campanhas, informou.
Intitulado “O Lugar do Funcionalismo Estadual e Municipal no Setor Público Nacional (1986-2017)”, o estudo mostra que o número de servidores nas prefeituras aumentou de 1,7 milhão para 6,5 milhões no período analisado. Nos Estados, a elevação foi de 2,4 milhões para 3,7 milhões. E na esfera federal a expansão foi de 1 milhão para 1,2 milhão.
Apesar da expansão, sustenta o estudo, o emprego público não cresce de forma descontrolada. Num período de análise mais curto, de 1992 a 2017, os empregados do setor público passaram de 9% da população economicamente ativa para 11%, “desautorizando interpretações que insistem em falar em movimento explosivo do emprego público no Brasil”.
O trabalho diz ainda que a expansão do emprego no setor público ocorreu em sintonia com o número de empregos no setor privado. Em 1986, 3,8% da população tinha vínculos de trabalho com o setor público, e 20,2%, com o setor privado. Em 2017, eram 5,5% e 25,5%, respectivamente.
“Em geral, portanto, o ritmo de expansão dos vínculos públicos acompanhou o ritmo de crescimento do setor privado – com variações em função dos movimentos cíclicos da economia ao longo do período estudado”, diz. “O mesmo movimento ocorreu em relação à população como um todo.”
Para “desmistificar” outro argumento em favor da reforma administrativa, o estudo minimiza a expansão das despesas de Estados e municípios com folha salarial. Admite que houve crescimento real, de 55% e de 78%, respectivamente, entre 2006 e 2017. Mas aponta relativa estabilidade no gasto como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). Passaram de 3,1% para 3,8% do PIB nos municípios e de 3,95% para 4,25% do PIB nos Estados.
CONTEXTO
O governo federal apresentou no ano passado duas propostas de emenda à Constituição (PECs) que atacam os gastos com folha salarial. As PECs Emergencial (186) e do Pacto Federativo (188) autorizam União, Estados e municípios a adotar medidas duras, como o corte de 25% em jornada e salários do funcionalismo, congelamento temporário de salários e suspensão de promoções.
Já a reforma administrativa, ainda a ser enviada ao Congresso, vai mexer com o tabu da estabilidade funcional. O propósito dela não é cortar gastos, mas reformar a estrutura do funcionalismo.
A mudança será fatiada. Em fevereiro, deverá ser proposta uma emenda à Constituição para que o governo possa contratar funcionários por outros mecanismos que não necessariamente lhes garantam a estabilidade.
A PEC virá “vacinada” contra focos de resistência. Por exemplo: não afetará a estabilidade de quem já está no serviço público. Os novos que ingressarem em carreiras típicas de Estado também contarão com emprego estável. Que carreiras são essas é algo ainda a ser definido. A mudança não afetará militares nem servidores do Legislativo e do Judiciário.
Por estar na Constituição, a mudança se aplica também a Estados e municípios. Precisa, porém, ser regulamentada por essas esferas de governo.
Outras fatias da reforma administrativa, que ainda não têm data para chegar ao Congresso, vão tratar de novidades como a avaliação de desempenho dos servidores e a redução do número de carreiras, entre outros pontos.
Em 2019, a aprovação da reforma da Previdência por um governo sem base legislativa foi um feito impressionante. O apoio do Congresso à necessidade de reformar a economia e superar a crise explica o fenômeno.
No Ministério da Economia, a aposta é que essa dinâmica se sustentará este ano. Com os salários dos professores em risco, quase 2 milhões de pessoas na fila do INSS e o pleito municipal no horizonte, 2020 será um teste e tanto. A orfandade da “PEC paralela” da Previdência mostra que resistências em Estados e municípios são fortes.
Fonte: Fonacate