Conforme artigo anterior (relembre aqui),o Analista e Consultor Político Antônio Queiroz analisa as novidades relevantes em relação às migrações anteriores, que precisam ser modificadas para evitar prejuízo à própria Funpresp e aos participantes. Confira.
1. Uniformização do tempo total no cálculo no fator de conversão do benefício especial
O cálculo do fator de conversão para o benefício especial, que antes tinha por base o tempo de contribuição de 35 anos para homens (445/13) e 30 anos mulher (390/13), bem como 30 anos e 25 anos (390/13 e 325/13), respectivamente, para professores e professoras da educação infantil, fundamental e médio, agora terá como referência única 40 anos (520/13), independentemente da questão de gênero, do exercício de atividade prejudicial à saúde, situação de risco ou Pessoa com Deficiência, configurando perdas da ordem de 12,5% só no caso da regra geral, conforme simulado na tabela a seguir.
Com base nas novas regras, Luiz Alberto dos Santos, produziu simulações de efeitos da alteração para 25, 20 e 15 anos de trabalho.
O cálculo do beneficial é complexo, por isso recomenda-se fazer a simulação no portal da Funpresp ou do governo federal. A título de ilustração, seguem os passos considerados no cálculo:
- Obter os valores das contribuições já realizadas;
- Atualizar mês a mês os valores obtidos, com base no IPCA, de todas as remunerações desde julho de 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior à quela competência;
- Obter a média aritmética simples das parcelas e abater o valor do INSS; e
- Aplicar o fator de conversão (proporcionalidade), obtendo o valor do benefício especial. O fator de conversão é resultado da divisão da quantidade de contribuições mensais efetivamente pagas pelo servidor ao Regime Próprio até a data da opção por 520. Quando maior o maior o divisor, menor o fator de conversão e, em consequência, o valor do benefício.
Os simuladores, porém, cometem um grave erro, o que deriva de interpretações administrativas, equivocadas, e ainda não superadas: para efeito do tempo total de contribuição, somente consideram o tempo de serviço a partir de julho de 1994. Ignoram, assim, tanto o tempo de contribuição de quem era celetista e se tornou estatutário com a Lei nº 8.112, de 1990; quanto o tempo de contribuição desde a Emenda nº 3, de 1993, a partir da qual passou a incidir contribuição para custeio de aposentadorias no Serviço Público. Embora a EC 20/98, no seu art. 4º, tenha determinado que o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, deve ser contado como tempo de contribuição, a “cegueira fiscalista” de órgãos do Governo tem causado transtornos na hora de fazer a simulação, pois acarreta rebaixamento no cálculo do benefício. O Poder Judiciário já vem se manifestando sobre isto, e reconhecendo o que a lei já determina: a consideração de todo o tempo de serviço público, inclusive do prestado a outros entes da Federação.
2. Contribuições de referência para cálculo do benefício especial
Se a uniformização do cálculo do fator, com o aumento do divisor para 520, já representou perda, a mudança na referência de contribuições, que passou a considerar todo o período contributivo e não apenas as 80% melhores contribuições, irá aprofundar ainda mais essas perdas. Antes o valor do benefício especial era calculado com base nas contribuições correspondentes a 80% do tempo decorrido desde julho de 1994, agora será de 100% de todo o período contributivo, o que poderá rebaixar a média, dado que durante longos períodos a partir dos anos 1990, em especial, os servidores sofreram perdas inflacionários e não tiveram reposição salarial.
Como a MP define a opção pelo benefício especial como ato jurídico perfeito, considerando o seu cálculo com base nas regras vigentes na legislação no momento da opção, a mudança claramente representou uma dupla perda para os novos aderentes: na ampliação do tempo total e na ampliação da quantidade de contribuição.
3. Tributação sobre o benefício especial
A MP estabelece que não haverá contribuição previdenciária sobre o benefício especial, mas afirma que o benefício estará sujeito a incidência do imposto de renda, em alíquota progressiva que poderá chegar a 27,5%. Acontece que o benefício especial é uma compensação ao servidor pelo tempo que ele contribuiu sobre a totalidade de sua remuneração e, sendo assim, deve ser vista como uma indenização, sobre a qual não deveria incidir imposto de renda.
Mesmo que eventualmente viesse a incidir imposto de renda, como essas contribuições eram de natureza previdenciária, de longa maturação, o mais justo seria que a alíquota do imposto de renda fosse regressiva, com alíquota inversamente proporcional ao tempo de recolhimento. Ou seja, quanto maior o tempo de contribuição, menor a alíquota.
4. Tentativa de mudança da natureza jurídica da fundação de previdência complementar
A tentativa de retirada da “natureza pública” das entidades fechadas de previdência complementar dos servidores federais é inócua, pois mesmo com a supressão das expressões, as funções criadas por lei, de acordo com o inciso IV, do art. 5º do Decreto-Lei 200/1976, com a redação dada pela Lei nº 7.596/1987, são fundações públicas, conforme segue:
Fundação Pública – a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes”
Logo, a supressão das expressões “natureza pública” não faz o menor sentido.
Contudo, a supressão dessa expressão poderá criar dificuldades para a Funpresp e também para o participante. No primeiro caso, a exclusão da natureza pública, poderá servir de pretexto para negar a cessão de servidores para a Funpresp, sob o fundamento de que não possui mais vínculo com a Administração Pública indireta. Atualmente existem aproximadamente 20 servidores cedidos, entre diretores e coordenadores.
O segundo caso, invocando o mesmo motivo, poderá vir a suscitar dúvidas quanto à aplicação da legislação tributária. O art. 4º, VII da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, alterado pela Lei nº 13.043, de 2014, prevê que na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda poderão ser deduzidas “as contribuições para as entidades fechadas de previdência complementar de natureza pública de que trata o § 15 do art. 40 da Constituição Federal, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social”, e o § 6º do art. 11 da Lei nº 9.532, de 1997, prevê que as deduções relativas às contribuições para entidades de previdência complementar a que se referem o inciso VII do art. 4º da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, desde que limitadas à alíquota de contribuição do ente público patrocinador, não se sujeitam ao limite de 12% do total dos rendimentos para fins de dedução.
Essa falha da Medida Provisória 1.119 é mais uma evidência do pouco zelo com que essas medidas – eivadas de inconstitucionalidades – são redigidas, mostrando incoerência e aumentando a insegurança jurídica, em vez de aumentá-la.
5. Teto de remuneração dos dirigentes do fundo de pensão
Outra mudança inócua, porque inconstitucional, é a tentativa de permitir o pagamento de remuneração superior ao teto para os dirigentes e servidores das entidades fechadas instituídas pela Lei nº 12.618. As fundações públicas, criadas por lei, mesmo de direito privado, integram a Administração Indireta, e sujeitam-se ao teto remuneração da Administração Pública de que trata o inciso XI do art. 37 da Constituição Federal.
6. Contratação pelo RDC
A MP também promoveu mudança na forma de contratação, alterando radicalmente o regime de licitação, desobrigando a Funpresp da realização de licitações públicas longas, impessoais e técnicas. Em seu lugar, autoriza a Funpresp a aplicar o RDC-Regime Diferenciado de Contratações praticado pelas estatais (empresas públicas e sociedade de economia mista) que fazem construções e obrigações num regime de monopólio, o que não é o caso da Funpresp. Por esse novo regime, a Funpresp poderá fazer contratação diretas de bancos de investimentos para administrar as contas individuais dos servidores, criando oportunidade para contratação de “amigos do rei”. Foi por esses mecanismos que outros fundos de pensão de estatais encontraram brechas para comprar títulos podres e deixar rombos e déficits gigantescos, que levaram a aumento de contribuição de até 30% nas contribuições dos participantes, como ocorreu com a Postalis.
Confira amanhã (01), na última parte do artigo, os critérios que devem ser observados diante da decisão de mudar ou não para a previdência complementar.