Diante do crescimento do agronegócio e de suas projeções, é óbvia a necessidade de avaliar o modelo atual de Defesa Agropecuária e, inevitavelmente, o papel do Auditor Fiscal Federal Agropecuário, frente aos desafios futuros
*Antonio Araujo Andrade Junior
O valor bruto da produção agropecuária em 2000 não passava de 261 bilhões de reais. Em 2012, já havia mais que dobrado. Em 2019, são estimados 603,4 bilhões de reais. E para a próxima década, as projeções apontam que o complexo agroindustrial brasileiro continuará crescendo. Diante do crescimento do agronegócio e de suas projeções, é óbvia a necessidade de avaliar o modelo atual de Defesa Agropecuária e, inevitavelmente, o papel do Auditor Fiscal Federal Agropecuário, frente aos desafios futuros.Mas, em que local do Mapa discute-se a Defesa Agropecuária, para além da conquista do próximo mercado? Duas alternativas. Não há tal discussão ou há de forma imperceptível, silenciosa, entre atores privilegiados. Sem ouvir a sociedade, o cidadão e o corpo especializado da casa.
Com efeito, o Mapa não possui mecanismos, ferramentas ou espaços que possibilitam a permeabilidade social, a participação do consumidor. Há participação do setor produtivo agropecuário, porém, a despeito de tratar de produtos agropecuários finais, não há participação de consumidores. O Tribunal de Contas da União já apontou a necessidade de tornar público os resultados das auditorias do Mapa, obviamente após o trânsito julgado. Mas, que auditorias?
As fiscalizações in loco nunca foram tão esparsas. Em dezembro de 2018, a ministra profetizou que “A fiscalização do Ministério será uma auditoria feita de tempos em tempos. Se achar que não está bom, vai lá toda semana.” A relação “Estabelecimentos registrados X Fiscalizações realizadas em 2017”, apresentada pelo TCU em 2018 demonstra que, a continuar o ritmo lento das fiscalizações, em algumas áreas os estabelecimentos somente verão um fiscal a cada quatro anos. Em algumas, a cada dez anos! Parece ser intencional resumir a atividade de fiscalização a um carimbo, uma homologação, uma assinatura digital, um monitoramento remoto, à análise de processos… para depois facilmente caracterizá-la como “entulho”.
Poder-se-ia argumentar em favor de uma ação a partir de análise de risco. Mas análise de risco é informação e informação depende de suporte de sistemas informatizados. Os sistemas do Mapa são quase sempre planilhas eletrônicas, editores de texto e ferramentas “desenvolvidos” localmente. Nas palavras do TCU, são inseguros e se resumem, em sua maioria, à gestão do cadastro de estabelecimentos. São antigos e desenvolvidos em tecnologias obsoletas, a manutenção e evolução é complexa, além de não possuírem documentação de validação. É também visível a ausência de interface gráfica, erros nas funcionalidades e intermitência no comportamento.
Por outro lado, quando há informação e auditoria e quando configura-se uma infração, os valores das multas no Mapa são tão irrisórios que incentivam a infração ao invés de punir e inibir. O valor máximo no Dipoa é R$ 15.648,00. Cerca de 73,25% das empresas registradas são de médio ou grande porte. Possuem Receita Operacional Bruta (ROB) Anual acima de R$ 4,8 milhões. Assim, o valor máximo da multa representa apenas 0,32% da ROB.
As multas não são convertidas para o serviço e não há cobrança de taxas. Assim, o orçamento destinado à defesa agropecuária, após aumento nominal de 126,7% entre 1997 e 2007, cresceu apenas 23,5% de 2007 a 2016. Entre 2012 e 2018, sofreu redução de 7% para 4% em relação ao orçamento total do MAPA. Hoje, é o menor dos últimos dez anos.
A Enagro patina. Não cumpre seu papel de capacitar, fazer a gestão por competência e a gestão do conhecimento. Vem cada vez mais perdendo dotação orçamentária e recursos materiais e humanos. Foi desconstruída. Figura hoje de forma tímida e limitada perante seu potencial. Retrocedemos também na questão da seleção meritocrática para preenchimento de cargos. A porteira da indicação política para as Superintendências foi novamente aberta.
O número de Auditores vem reduzindo a olhos vistos, ano após ano. Éramos 4.040 em 2000; 2.637 em 2016 e hoje somos 2.441, dos quais, mais de 30% recebem abono salarial. E o que faz o Mapa? Contrata e recontrata médicos veterinários temporários, à revelia da lei; não define a situação de agrônomos do extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário; aceita relatoria de processos por pesquisadores da Embrapa; cogita contratar “peritos” pagos pelos interessados para análise de registros de produtos; repassa a responsabilidade dos documentos utilizados no exercício da fiscalização para carreiras técnicas de fiscalização federal agropecuária e transfere a Inspeção fitossanitária em madeira, vejam bem, “inspeção fitossanitária”, para auxiliares operacionais, cujo requisito de ingresso é o nível básico de escolaridade.
Após negociação salarial em 2016, os Auditores Agropecuários tiveram suas remunerações reajustas em 10,8%, por meio de duas parcelas anuais. Se por um lado conquistou a denominação de Auditor, por outro, a negociação aprovada pela maioria da carreira distanciou-se das remunerações das demais carreiras de auditoria. Estas, que já dispunham de remuneração maior, uma vez que negociaram reajustes em quatro anos, alcançaram valores acima do IPCA de 18,5%, previsto para o período 2016/2019.
Indiferença da gestão na elaboração de políticas, ausência de capacitação continuada, falta de incentivos meritocráticos, redução do número de fiscalizações e das condições físicas de trabalho, multas irrisórias, arrocho orçamentário, enxugamento do número de auditores e distinção remuneratória em relação às demais carreiras de auditoria. Esse é o cenário do V CONAFFA, a realizar-se em Maceió, entre 21 e 25 de outubro, sob o tema “Consciência e Participação Sindical”.
Um grupo selecionado de Auditores Agropecuários estará reunido com objetivo de delinear as ações do ANFFA SINDICAL para os próximos três anos. Discutirão trajetórias possíveis para que sejamos cada vez mais fiéis a quem deposita em nós a confiança da segurança de seus alimentos, o cidadão brasileiro. Um profícuo congresso a todos!
*Antonio Araujo Andrade Junior é Médico Veterinário, Auditor Fiscal Federal Agropecuário, diretor de política profissional do ANFFA Sindical.