A promessa de reajuste salarial para servidores públicos feita pelo governo Jair Bolsonaro (PL) durante o mandato dele ficará a cargo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que vai tomar posse em 1º de janeiro de 2023
No governo Bolsonaro, só receberam reajustes, os militares das Forças Armadas, a ser implementado em parcelas, até julho de 2023, e as polícias Civil, Militar e Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, cujos salários são pagos pela União.
Os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário até concordaram com a revisão geral de 5%, que estava autorizada pela Lei Diretrizes Orçamentária para 2022, inclusive contemplando a reestruturações de carreiras, mas não foi levada à frente pelo atual governo.
O reajuste ficou adiado para 2023 que, na perspectiva dos servidores, é uma temeridade, tanto pela falta de credibilidade do governo nesse tema, quanto pelos obstáculos deixados pelo atual governo para a concessão.
Em primeiro lugar, porque o espaço fiscal está reduzido, não em razão do teto de despesas, mas do déficit público deixado. A PEC 32/22, apenas aumenta o teto, para acomodar as despesas com benefícios sociais e outros, mas não há sinalização de que isso de fato vá facilitar a vida dos servidores.
Em segundo, porque possui as travas de gastos previstas na EC 109, chamada de gatilhos fiscais. A relação entre despesa primária geral e despesa primária obrigatória chegará a 95%, e o próximo chefe do Executivo, mesmo que queira, terá dificuldade em conceder qualquer reajuste diante do quadro fiscal, dada a elevação do déficit público, inclusive em decorrência da própria PEC 32/22.
Em terceiro, porque essa decisão de reajuste dependerá da nova política fiscal que poderá revisar e até revogar o teto de gastos, que se demostrou ineficiente durante a aplicação, mas, também, da existência de disponibilidade orçamentária.
Por fim, para que quaisquer proposições que envolvam os servidores públicos possam ter efeito em 2023, é necessário que:
- sejam incluídas no Ploa (Projeto de Lei Orçamentária Anual) as dotações necessárias para a execução em 2023;
- sejam consideradas as proposições ou anteprojetos, no Anexo 5 do Ploa 2023; e
- sejam encaminhadas as proposições legislativas correspondentes.
Para 2023, o Ploa contempla a possibilidade de aumento de despesas, para tal fim, de R$ 13,3 bilhões, dos quais R$ 11 bilhões no Poder Executivo; há ainda “reserva” de R$ 3,5 bilhões, que o relator poderá destinar para acolher emendas, ou remanejar para reajustes no Executivo.
Mas, até o momento, o governo não enviou nenhum projeto de lei para conceder reajuste ao Congresso e o novo governo poderá fazê-lo em 2023. Mas qualquer reajuste somente produzirá efeito a partir da data da aprovação e publicação da lei que o conceder.
Somente o Poder Judiciário e o Ministério Público encaminharam projetos de lei de reajuste, prevendo 18% em 4 parcelas, até julho de 2024. O Senado encaminhou projeto com reajuste em 4 parcelas anuais até 2026, totalizando apenas 18%. Câmara e TCU deverão enviar projetos com o mesmo efeito, nos próximos dias.
Esses percentuais, porém, não apenas não repõem as perdas inflacionários, como disfarçam a ausência de revisão geral anual, obrigatória, prevista no artigo 37, X da Constituição.
As perdas acumuladas são diferenciadas segundo os cargos e carreiras: cerca de metade dos servidores federais, cujo último reajuste foi em 2017, já acumulam, em outubro de 2022, mais de 34% de perdas; quem teve reajuste em janeiro de 2019, tem perdas acumuladas de quase 26%, segundo o IPCA.
Caso os servidores tenham, nos próximos 4 anos, apenas 18% de reposição, chegarão ao final do mandato do presidente Lula com perdas não recuperadas entre 21% e 29%, respectivamente, desde 2019 ou 2017.
A garantia de reajustes remuneratórios e concessões de vantagens somente serão implementados caso as propostas sejam transformadas em lei.
No caso do Poder Executivo, caso o presidente da República envie projeto de lei em fevereiro, teria que votar até o final de março para vigorar em abril como prevê a proposta do Judiciário. No entanto, até o momento nenhum compromisso foi firmado pela Equipe de Transição, nesse sentido.
(*) Consultor legislativo do Senado, advogado, mestre em Administração, doutor em Ciências Sociais; ex-subchefe de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil da PR (2003-2014); professor colaborador da Ebape/FGV. Sócio da Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas. Membro do corpo técnico do Diap
(**) Jornalista, administrador, analista político e diretor licenciado de Documentação do Diap. Sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.