A PEC do congelamento do gasto público dificulta ainda mais a disputa por recursos, especialmente para os serviços e servidores públicos. É que se o gasto extrapolar a despesa do ano anterior, corrigida pelo IPCA, os cortes incidirão sobre os direitos dos servidores, em primeiro lugar.
Por Antônio Augusto de Queiroz (*)
A crise fiscal, a PEC do teto de gastos (PEC 55/2016) e a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o direito de greve do servidor público tornam urgente a regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da negociação coletiva no serviço público.
Em período de crise fiscal – no qual há aumento do conflito distributivo, ou seja, a disputa pelos recursos orçamentários se acirra – quem não tiver instrumentos ou meios para participar dessa contenda, fica claramente em desvantagem.
A PEC do congelamento do gasto público dificulta ainda mais a disputa por recursos, especialmente para os serviços e servidores públicos. É que se o gasto extrapolar a despesa do ano anterior, corrigida pelo IPCA, os cortes incidirão sobre os direitos dos servidores, em primeiro lugar.
A decisão do STF, que determina o desconto dos dias paralisados, em caso de greve no serviço público, por sua vez, é outro elemento que dificulta a luta por valorização dos servidores e dos serviços públicos.
A despeito de ter sido aprovada conclusivamente pelo Congresso em 30 de março de 2010, de ter sido ratificada pelo Decreto presidencial nº 7.944, de 6 de março de 2013, e de ter sido feito o registro da ratificação na OIT em junho do mesmo ano, a Convenção 151 da OIT até hoje não entrou em vigor plenamente porque está pendente de regulamentação.
Nesse cenário, a regulamentação da Convenção ganha relevo, porque, uma vez regulamentada, os agentes públicos serão obrigados a sentarem-se à mesa de negociação, e havendo recusa em negociar ou o descumprimento do que for pactuado, legitima-se o exercício de direito de greve sem desconto dos dias paralisados.
Com o propósito de regulamentá-la, existem no Congresso vários projetos de lei, porém o mais adiantado, porque já foi aprovado no Senado e aguarda deliberação na Câmara, é o PL 3831/2015, do senador Antônio Anastasia (PSDB/MG), atualmente sob relatoria do deputado Betinho Gomes (PSDB/PE), na Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.
O projeto, que também é o mais completo entre muitos, conta com o apoio das centrais sindicais e das entidades sindicais de servidores. Ele não apenas incorpora os princípios da Convenção 151 e da Recomendação nº 159, da Organização Internacional do Trabalho no ordenamento jurídico brasileiro, como também disciplina o modo de aplicação desses princípios e enunciados na negociação coletiva envolvendo entes públicos.
O PL 3831 está estruturado em cinco capítulos: I – Disposições gerais, com os principais conceitos; II – Dos princípios, dos objetivos gerais e dos limites, que detalha as regras e procedimentos a serem observados; III – Da forma, da abrangência, do objeto, dos atores e do instrumento de formalização da negociação coletiva, que trata dos meios e instrumentos abrangidos ou envolvidos no processo e negociação; IV – Da negociação coletiva e da relação com o Poder Legislativo, que dispõe sobre os procedimentos que exigem lei; e V – Disposições finais e transitórias.
A prioridade dos servidores e suas entidades, numa situação de dificuldade como esta, não poderá ser outra senão regulamentar a Convenção 151 da OIT, já que a mesma não só reconhece o direito, obriga o governante e legitima a negociação coletiva no serviço público, como possibilita o pleno reconhecimento do direito de greve, seja por recusa à negociação, seja por descumprimento do que for negociado.
(*) Jornalista, Analista Político e Diretor de Documentação do Diap.