Os esforços para rastrear os infectados pelo vírus chegaram a becos sem saída no caso de alguns frigoríficos que não conseguiram dar os endereços de todos seus funcionários, já que trabalhavam com firmas terceirizadas fornecedoras de mão-de-obra imigrante.
Quanto a carne deveria custar? Mais do que custa agora, defende a ministra da Agricultura da Alemanha, Julia Kloeckner. Depois de um surto de coronavírus detectado em um abatedouro na Alemanha ter jogado os holofotes sobre os padrões de qualidade dos frigoríficos no pais, Kloeckner tenta convencer os consumidores – muitos com orçamento limitado – a deixar de contar com carnes a preços baixos.
“A carne é barata demais”, disse Kloeckner. “Propagandas fantásticas de carnes de baixos preços não condizem com a sustentabilidade e a apreciação […] Isso não é mais aceitável”. Carnes baratas, desde o salame às tradicionais “wurst”, as salsichas alemãs, são um alimento básico para muitos alemães, mas um recente surto de covid-19 em um frigorífico no oeste do país gerou questionamentos sobre as práticas adotadas para manter os preços baixos.
Os esforços para rastrear os infectados pelo vírus chegaram a becos sem saída no caso de alguns frigoríficos que não conseguiram dar os endereços de todos seus funcionários, já que trabalhavam com firmas terceirizadas fornecedoras de mão-de-obra imigrante. Algumas dessas firmas de terceirização, por sua vez, também subcontratavam outras empresas para conseguir mão-de-obra.
O ministro do Trabalho da Alemanha, Hubertus Heil, condenou o sistema de “sub- ubsubcontratação” nos frigoríficos e está apresentando uma nova lei que os obriga a contratar pessoal diretamente.
Além disso, a ministra da Agricultura planeja uma série de medidas para enfrentar as “sérias consequências” da pressão por baixos preços da carne sobre o bem-estar dos animais e as condições de trabalho nos frigoríficos, assim como sobre a renda dos pecuaristas. Ela sabe que a iniciativa traz o risco de afugentar as empresas para o exterior e, dessa forma, de perder o controle sobre os padrões de qualidade. Kloeckner propôs um imposto de bem-estar animal para compensar os pecuaristas pelo custo decorrente da melhoria nos cuidados com o gado. Para conter o risco de afastar o processamento de carne para fora do país, ela defende um selo europeu de bem-estar animal para as carnes.
O site Numbeo, de dados sobre custo de vida, estima que um quilo de carne bovina custa € 10,64 na Alemanha, € 16,67 na França, € 14,58 na Holanda e € 12,32 na Dinamarca.
A VDF, associação alemã da indústria de processamento de carnes, aceitará as mudanças. “O setor decidiu abandonar o sistema de trabalhadores subcontratados no abate, corte e empacotamento de carne o mais rápido possível”, disse o diretor da VDF, Heike Harstick.
Os processadores de carne de aves na Alemanha também abandonarão a terceirização da mão-de-obra em 2021, mas a adoção de funcionários em regime de emprego permanente levará ao aumento no custo de produção e no preço final, segundo a associação do setor ZDG. “Acreditamos que os consumidores e os varejistas de alimentos mostram disposição em aceitar esses custos”, disse o presidente da ZDG, Friedrich-Otto Ripke. A DBV, associação dos agricultores alemães, também apoiou os planos do governo para frigoríficos.
Combinados, os planos de Kloeckner e a ofensiva do governo para melhorar os padrões de trabalho nos frigoríficos deverão elevar os preços da carne e diminuir a vantagem comparativa da Alemanha no comércio exterior em relação a outros países da Europa Ocidental, segundo Hubertus Gay, analista sênior de políticas agrícolas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Fonte: Valor Econômico.